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quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Acompanhando cem anos de ensino

 


Educação: um meio para o desenvolvimento tecnológico

Fonte: FAPERJ  Vilma Homero

 Divulgação / USS
       
       No Iphan, a professora Lucia Aversa pesquisa documentos,
         livros de presença e provas de estudantes do século XIX
 
Nas diversas épocas da história, a necessidade do desenvolvimento de novas tecnologias tornou ainda mais evidente a importância de se investir na educação, em particular no ensino da matemática. Desde os cursos que ensinassem a arte de "deitar bombas" para manter a defesa nacional, de meados do século XVIII, aos grandes projetos desenvolvimentistas que sucederam a Segunda Guerra Mundial, o Brasil passou por várias tentativas de acelerar seu crescimento. Analisar esse percurso nas chamadas escolas de primeiras letras foi o alvo do projeto coordenado pela professora Lucia Maria Aversa Villela, da Universidade Severino Sombra (USS), que, com recursos do programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico Regional (DCTR), da FAPERJ, vem levantando os rastros históricos sobre o ensino primário dessa disciplina, em Vassouras, no século compreendido entre 1869 e 1969.
Como conta a pesquisadora, o ensino em geral e da matemática em particular passou por muitas mudanças no país. "Em outubro de 1827, D. Pedro I já mandava criar escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do Império", diz a pesquisadora, sobre a tentativa imperial de ampliar o ensino. No caso do que chamamos de matemática hoje, o que vigorava até o século XIX, começo do XX, eram várias disciplinas distintas, como aritmética, geometria e trigonometria. "Foi somente a partir de 1930, quando houve a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública, no governo de Getúlio Vargas, que essas matérias passariam a integrar uma mesma disciplina, a matemática", explica. A mudança já se deu como uma das várias tentativas de se investir na educação. Iniciativas que se tornam ainda mais prementes no período após a Segunda Guerra Mundial, tendo em vista a necessidade do desenvolvimento de novas tecnologias. E, nesse caso, voltam-se os olhares particularmente para o ensino da matemática, base para se dominar o conhecimento no campo tecnológico.
A educação no país, no entanto, nem sempre foi valorizada, especialmente em seus primórdios. No século XIX, a maior parte das escolas brasileiras foram abertas a partir de iniciativas particulares ou eram fruto de doações de famílias abonadas, muitas delas funcionando junto às fazendas, para alfabetização das crianças da localidade. "Foi apenas depois da independência que surgiu a primeira legislação sobre educação, falando da necessidade da criação de escolas normais, ou seja, para a formação de professores. A primeira escola do gênero na América Latina foi criada em Niterói, em 1835. A iniciativa, porém, não teve continuidade e a escola funcionou com períodos de interrupção", explica.
Na época, as provas de seleção para os professores que atuariam nas escolas públicas fluminenses eram promovidas pelas várias Câmaras municipais. Mas pelo que mostram os documentos e artigos pesquisados pela professora, o número de formandos não era suficiente para abranger a demanda dos diversos municípios do estado. Os aprovados – em geral, homens, já que a princípio a profissão era predominantemente masculina, que não haviam recebido formação específica para o cargo – mudavam-se para a cidade com suas esposas, que também, muitas vezes, embora sem contar com qualquer preparo formal, ficavam encarregadas da educação das moças. Os relatórios elaborados sobre o aprendizado dos alunos e os gastos feitos eram submetidos ao final de cada trimestre a uma supervisão da Câmara, para que se efetuasse o pagamento dos vencimentos, correspondente ao período já trabalhado. "Essa situação permaneceu mais ou menos até a república", comenta Lucia.
Vassouras: poucas escolas nas chamada Londres tropical
No caso de Vassouras, alvo dos estudos da pesquisadora, a comarca, criada em 1835, passaria à categoria de cidade em 1859, durante o auge do período cafeeiro, na região. O crescimento econômico local – que concentrava o capital nas mãos dos fazendeiros e havia feito crescer a venda de títulos de nobreza – levou Vassouras a ser conhecida como a "Cidade dos Barões". Toda essa riqueza, que fazia de Vassouras a capital econômica do país, se traduzia nas palavras de O Vassourense, o jornal da região, que comparava a cidade a uma pequena Londres tropical: "de magníficos edifícios, ruas largas e bem calçadas, de praças luxuosamente ajardinadas (...), cujos habitantes são, na maior parte, pertencentes à classe superior da sociedade." Lá também começavam a ser vistas as novidades da Europa, as casas de moda, as companhias teatrais e os colégios para meninos e meninas, que timidamente começaram a surgir a partir de 1833.
A precariedade da instrução pública no Rio de Janeiro de final da década de 1830 e o alcance da formação oferecida pelas escolas normais podem ser conferidos nas palavras do relatório do conselheiro José Paulino Soares de Souza, que fala sobre a situação, em 1839: "Vinte e cinco são as escolas publicas de primeiras letras que hoje existem na provincia, das quais quatro são de meninas. As 21 hoje em exercicio, são freqüentadas por 853 meninos e 76 meninas que perfazem a totalidade de 929 alumnos." Tal como em toda a província do Rio de Janeiro, também em Vassouras era flagrante a situação em 1879, quando a população de pouco mais de 19 mil habitantes contava com um total de 16 escolas, espalhadas pelos cinco distritos da região. A criação de novos núcleos de ensino era dificultada pelos baixos salários, condições precárias de instalação e pela grande distância entre as escolas, fatores que se somavam ao despreparo dos professores e à filosofia vigente de um ensino mnemônico, ou seja, fundamentado no aprendizado pela memória.
"Percebemos vários outros problemas enfrentados pelos profissionais que atuavam naquelas escolas. Eles trabalhavam com turmas de séries e idades diferentes numa mesma sala, com uma população de estudantes flutuante. Dependendo da época das colheitas, das estações de chuvas ou por conta de epidemias, a frequência se reduzia drasticamente. Sem contar os problemas de locomoção, para o professor e para os alunos, com escolas distantes por vezes mais de uma légua, o que implicava despesas e tempo."
A partir de 1889, um mapa de "Matrícula dos alunnos da Eschola Municipal de Massambará" citava que a turma de 23 alunos, de 7 a 14 anos, contava com apenas oito estudantes com sobrenome. Os demais tinham ao lado do nome apenas a palavra "liberto". "A abolição dos escravos e a proclamação da república correspondem a marcos de tentativas de mudança no ensino. Data dessa época a abertura de escolas noturnas naquele espaço, que atenderiam a uma nova classe trabalhadora. As relações e ideais mudavam, o que pode ser comprovado, por exemplo, ao se perceber que os documentos emitidos após 1890 já são endereçados ao 'cidadão' em vez de ao 'excelentíssimo' presidente da Câmara." Também é daquele período a realização de um esforço para se mapear as condições das escolas existentes. "Mas não havia nesses discursos iniciativas para incluir as camadas populares nas escolas nem se passou a dar uma maior valorização à educação", avalia a pesquisadora.
Com a cultura escolar sempre em mudança, a partir da década de 1980, em um mundo que clamava por educação para todos, surgem novas propostas para o ensino de matemática. "É uma mudança voltada para o desenvolvimento não só da matemática, mas do tipo de mentalidade que teve suas sementes plantadas no pós-guerra, mas só começou a se disseminar com maior intensidade nos anos 1970", explica a pesquisadora. Sai de cena a supervalorização da tabuada e prioriza-se o raciocínio. Em vez dos problemas típicos por meio dos quais se procurava ensinar a matéria, procura-se adaptar as questões à realidade do aluno, estimulando-os a perceberem o todo em que aquele conhecimento se insere. "Pegando-se como exemplo o tema 'cerveja', pode-se aliá-lo a outras disciplinas para se contar sua história, falar-se se sua composição química e proporcionalidade de componentes. Outro exemplo pode ser estimar o custo da pintura das torres do gasômetro, incluindo-se quantos galões de tinta serão necessários, quantos operários e, considerando-se todos os gastos, em quanto sairá a obra. Tudo isso proporciona ao aluno fazer diversas associações e serve como forma de ampliar o raciocínio. O que importa é que, sempre que possível, os temas surjam da curiosidade dos estudantes", fala.
A investigação dos pesquisadores já rendeu uma dissertação de mestrado profissional, de Heloísa Helena de Fontes Salvador ("Analisando as provas de alunos do curso primário em tempos de modernização da matemática escolar, 1950-1969") e um trabalho de iniciação científica de licenciatura em matemática, de Vanice dos Santos Costa ("As provas de aritmética do ensino primário em tempos do império, 1869-1889"). Outras pesquisas estão em andamento como parte do projeto: uma segunda dissertação de mestrado, de Carlos Alberto Marques de Souza ("A escola primária republicana e a aritmética do curso primário, 1889-1946"); e dois trabalhos de iniciação científica: de Lucio Flávio Monsores Lavinas ("A arte de carpinteiros e marceneiros e a implantação do sistema métrico decimal no Brasil: o século XIX em Vassouras") e de Claudiani Pereira Alves ("As metodologias da divisão em alguns livros didáticos brasileiros da primeira metade do século XX"), além de trabalhos de pré-iniciação científica, com alunos bolsistas do projeto Jovens Talentos, da FAPERJ.
Todas essas informações deverão ser reunidas no livro As provas de alunos e as transformações da matemática escolar do curso primário, 1869-1969, a ser organizado por Lucia e por Wagner Rodrigues Valente, pesquisador da Universidade Federal do estado de São Paulo (Unifesp) e colaborador da equipe. "Estamos ainda disponibilizando esses dados on-line no portal do Laboratório de Pesquisa em História da Educação Matemática (http://www.laphem.com.br), que já está no ar, em caráter experimental."

© FAPERJ – Todas as matérias poderão ser reproduzidas, desde que citada a fonte.







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