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quinta-feira, 17 de março de 2011

** Atrizes e intelectuais

 
Atrizes e intelectuais

Estudo sobre o teatro em São Paulo de 1940 a 1968 e suas conexões com a cena intelectual, a universidade, a cidade e as questões de gênero está no livro Intérpretes da Metrópole

Atrizes e intelectuais

17/3/2011
Por Fábio de Castro
Agência FAPESP – Para compreender como São Paulo se tornou, entre 1940 e o fim da década de 1960, um moderno polo do teatro brasileiro, é preciso que a análise se estenda para além do universo teatral. Abordando o teatro daquele período em suas conexões com a cidade, com a universidade e a cena intelectual paulista e com as questões de gênero, a professora Heloísa Pontes, do Departamento de Antropologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), estudou a questão ao longo de sete anos.
O resultado é o livro Intérpretes da Metrópole: História Social e Relações de Gênero no Teatro e no Campo Intelectual, 1940-1968, que será lançado no dia 29 de março. A obra teve apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Publicações, o que foi fundamental para a qualidade gráfica e editorial alcançada, segundo a autora..
Heloísa, que também é pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero Pagu da Unicamp, explica que procurou escapar de uma abordagem tradicional que trata o teatro como um fenômeno isolado da vida intelectual e cultural, para pensá-lo em conjunto com a produção de novas linguagens e instituições que modelaram a vida cultural da cidade de São Paulo no período.
"Procurei explorar as intersecções entre o espaço urbano, a universidade, as instituições culturais e as formas de sociabilidade, para inscrever o teatro no interior de um quadro mais amplo de questões e ligações", disse à
Agência FAPESP
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O estudo correspondeu à sua tese de livre-docência, defendida em 2008 na Unicamp. Esse trabalho, por sua vez, foi fruto de dois Projetos Temáticos financiados pela FAPESP, dos quais participou como pesquisadora: Gênero, corporalidades, coordenado por Mariza Corrêa, também do Pagu-Unicamp e Formação do campo intelectual e da indústria cultural no Brasil contemporâneo, coordenado por Sérgio Miceli, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP).
O livro estabelece também um forte diálogo com outro, Metrópole e cultura, de Maria Arminda do Nascimento Arruda, professora do Departamento de Sociologia da FFLCH-USP. Maria Arminda, que também fez parte da equipe do Temático coordenado por Miceli, foi orientadora do doutorado de Heloísa, concluído em 1996.
"A questão fundamental era pensar a história social do teatro, da universidade e da vida intelectual em um contexto que permitiu o surgimento, em São Paulo, de algumas das companhias teatrais mais importantes do Brasil naquela época", disse Heloísa.
A autora procurou fazer a análise do ponto de vista das relações de gênero, investigando como diversas intelectuais e atrizes se destacaram na época. "Observei algumas trajetórias particulares, com o objetivo de pensar como essas mulheres conseguiam, por meio da consolidação de seus nomes e de suas carreiras, adquirir a autoridade cultural, artística e intelectual que fizeram delas protagonistas daquele momento cultural", disse.
A cena cultural da época é contextualizada a partir de um estudo comparativo entre os intelectuais paulistas da revista Clima e os norte-americanos aglutinados em torno Partisan Review, de Nova York.
"Tratava-se de um contexto de efervescência cultural, com a vinda de diversos artistas que fugiam das perseguições durante a Segunda Guerra Mundial, com a presença das missões estrangeiras que fundaram a USP. Por outro lado, Nova York recebia uma onda de imigração marcada por grandes intelectuais judeus. Em ambas as cidades, a presença desses europeus seria fundamental para o adensamento da cena cultural. Até a década de 1920, os intelectuais e escritores norte-americanos tinham a Europa como rota obrigatória", explicou.
Grandes damas
Após a discussão do contexto, Heloísa compara as trajetórias de três importantes críticas de cultura e escritoras: Lúcia Miguel Pereira, Patrícia Galvão e Gilda de Mello e Souza.
Em seguida, o teatro brasileiro é abordado a partir da análise da trajetória das chamadas grandes damas da cena teatral nacional: Cacilda Becker, Maria Della Costa, Tônia Carrero, Nydia Licia, Cleyde Yáconis e Fernanda Montenegro – todas provenientes do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), criado em 1948.
"Diferentemente das intelectuais, que enfrentaram muitos constrangimentos para estabelecer seus nomes, as atrizes tiveram o respaldo de seus parceiros", disse Heloísa.
"Com exceção de Cleyde Yáconis, todas as seis grandes damas, depois de deixarem o TBC, criaram suas próprias companhias, nas quais eram as primeiras atrizes, tendo seus parceiros como empresários ou diretores", contou.
Um dos capítulos do livro faz ainda uma análise sobre a contribuição dos franceses Louis Jouvet e Henriette Morineau e do brasileiro Décio de Almeida Prado para a consolidação do teatro moderno no país.
Intérpretes da Metrópole: História Social e Relações de Gênero no Teatro e no Campo Intelectual, 1940-1968
Autor: Heloisa Pontes
Lançamento: 2011
Preço: R$ 89
Páginas: 464
Mais informações: www.edusp.com.br
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** Pesquisa Fapesp: Não escrever em inglês limita pesquisas brasileiras (e francesas e alemãs)

 

Pesquisa FAPESP
Edição 181 - Março 2011
Política de C & T > Cienciometria
Código sagrado
Estudo mostra que pesquisadores da França e da Alemanha também perdem influência quando não publicam em inglês
Fabrício Marques

A proverbial barreira do idioma, responsável pela baixa repercussão da produção científica escrita em qualquer língua que não seja o inglês, não atrapalha apenas os pesquisadores de países emergentes como o Brasil. Um estudo liderado pelo físico Anthony van Raan, diretor do Centro para Estudos de Ciência e Tecnologia da Universidade de Leiden, na Holanda, mostrou que o problema também prejudica potências europeias da ciência como França e Alemanha, que só estão atrás de quatro rivais – Estados Unidos, China, Reino Unido e Japão – no ranking das nações que mais publicam artigos científicos. Ainda assim, cientistas franceses e alemães amargam um impacto mais modesto de sua produção científica quando a divulgam em seus idiomas maternos.

Anthony van Raan, especialista em cienciometria, a disciplina que busca gerar informações para estimular a superação dos desafios da ciência, é um dos responsáveis pelo Ranking Leiden, coleção de dados gerados pela universidade holandesa que busca analisar a produção científica de países e instituições de pesquisa e ensino superior. Na mais recente edição do ranking holandês, a Universidade de São Paulo (USP) despontava na 15ª posição na lista de universidades com maior volume de produção científica (ver reportagem na página 35). O estudo sobre a barreira do idioma debruçou-se sobre uma lista das principais 500 universidades do mundo, ranqueadas de acordo com o impacto obtido por seus artigos científicos na base de dados Web of Science (WoS), da empresa Thomson Reuters. O fator de impacto é medido pela quantidade de citações de um artigo em outros trabalhos científicos. O pesquisador holandês havia observado que o desempenho modesto de várias universidades francesas e alemãs em rankings estava descolado do prestígio acadêmico de que elas desfrutam. Para fazer um exercício de comparação, produziu uma segunda lista, na qual apenas a produção científica publicada em revistas em inglês foi considerada e os artigos em idioma local foram desprezados. Van Raan constatou que a performance das universidades alemãs e francesas era superior no rankingapenas com artigos em inglês, pois o impacto desses trabalhos era maior do que o dos artigos divulgados em idioma nativo.

A Universidade de Nantes, por exemplo, aparece na 106a posição no ranking dos artigos em inglês – e em 201o lugar na lista que considera artigos também em outras línguas. As universidades alemãs de Heidelberg e LMU de Munique aparecem, respectivamente, em 109º e 114º lugares no ranking do impacto baseado apenas nos artigos em inglês, mas caem para a 150ª e a 166ª posições quando se contam todos os artigos. "Encontramos um efeito dramático e subestimado nas medidas de impacto", afirmou Van Raan. "Os artigos não publicados em inglês diluem o impacto médio de países como Alemanha, Áustria e França. Isso acontece particularmente com campos aplicados, como a medicina clínica e a engenharia, e também com as ciências sociais e as humanidades. Como a medicina representa uma parte considerável da ciência de um país, esse efeito influencia a posição da universidade."

Ferramenta – A preocupação de Van Raan refere-se ao uso de indicadores bibliométricos vinculados a fatores de impacto. Como as citações têm um peso importante emrankings de universidades, como o da Times Higher Education e o da Universidade Shanghai Jiao Tong, da China, o pesquisador sugere cautela ao analisar essas listas e propõe uma alternativa polêmica para remover o viés: levar em conta, para efeito de comparação, apenas a produção científica em inglês das instituições, desprezando os artigos em outros idiomas. "Calcular os indicadores baseados apenas em publicações em inglês é o único procedimento justo", afirma.
Não há novidade alguma em afirmar que a proficiência no inglês é ferramenta indispensável para pesquisadores de todos os campos do conhecimento. Isso já era verdade nos anos 1930, quando pesquisadores alemães publicaram, em seu próprio idioma, um estudo que relacionava o consumo de cigarro à incidência maior de câncer no pulmão. Devido à barreira do idioma, os dados mantiveram-se praticamente desconhecidos até os anos 1960, quando britânicos e norte-americanos chegaram à mesma correlação. Atualmente, lutar contra a supremacia do inglês na ciência é contraproducente, diz Sonia Vasconcelos, pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e autora de uma tese de doutorado sobre a barreira do idioma defendida em 2008 (ver Pesquisa FAPESP nº 162). "Os países em que o inglês é o principal idioma levam grande vantagem, mas existe uma mobilização internacional por parte de instituições de pesquisa e editores científicos de vários países não anglofônicos para reduzi-la. No caso do Brasil, é preciso treinar cada vez mais os nossos pesquisadores, particularmente nas áreas de ciência e tecnologia, para escrever bem em inglês e desenvolver alguma independência para se comunicar com seus pares em contextos internacionais", afirma. "Hoje, na Alemanha, há cursos de pós-graduação ministrados em inglês, o que ajuda os estudantes a quebrar essa barreira. Isso acontece também na França, que sempre cultivou – e continua cultivando, porém com uma atitude estratégica em relação ao inglês – seu idioma no cenário acadêmico. Já o Brasil não tem uma estratégia articulada para enfrentar esse desafio", diz.

A sugestão de Van Raan de ignorar a produção científica em língua nativa para aperfeiçoar as comparações internacionais poderia causar outro tipo de viés, causado pela ausência da contribuição em importantes campos do conhecimento. "A produção em língua local é parte indissociável do conhecimento gerado pelos países e não pode ser posto de lado", diz Abel Packer, da coordenação da biblioteca eletrônica científica SciELO Brasil. Packer lembra que há uma tradição no país de publicar em português em disciplinas como, por exemplo, as ciências da saúde e as agrárias, pois isso é importante para levar o conhecimento a profissionais dessas áreas. "A questão não envolve só os cientistas, que em geral conhecem o inglês, mas outros usuários da informação científica que não têm a mesma proficiência do idioma", diz. "O multilinguismo é parte da comunicação científica e tem suas raízes no fato de que a ciência é parte da cultura. A ciência não é feita em uma torre de marfim separada do resto da sociedade, mas é reconhecida com uma fonte de conhecimento para o desenvolvimento econômico e tecnológico. Se não existir esforço da comunidade científica nacional para criar semânticas na sua língua nativa, o país e a sua cultura não serão capazes de absorver ideias e conhecimento que na essência servem a sua sociedade".
Para Luiz Henrique Lopes dos Santos, coordenador adjunto de Ciências Humanas e Sociais, Arquitetura, Economia e Administração da FAPESP e professor do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, a questão requer uma solução de compromisso, pois não se reduz à questão do impacto. "É também uma questão cultural", diz. "A língua é um elemento essencial da cultura de um país e ela se constitui e se enriquece na interação entre os seus usos mais ordinários e os mais sofisticados – como na literatura, na ciência, na filosofia. Nenhum país pode se dar ao luxo de abrir mão inteiramente de sua língua como veículo da produção do conhecimento."
Adicione-se ao debate, propõe Packer, o fato de estar crescendo a produção escrita em português no bolo de revistas indexadas. Até 2007, a porcentagem dos artigos publicados em português na base Web of Science era de 8,5%. Agora é de 22%. "Isso aumentou porque se ampliou o rol de revistas brasileiras indexadas. Eram 34 revistas em 2007 e hoje são 133. Assim, o Brasil subiu para o 13º no ranking da produção científica. Se não quisermos que revistas em português sejam consideradas, voltaremos para o 17º lugar", afirma.
Dado marcante – Também se deve considerar que escrever em inglês não é condição suficiente para garantir citações e prestígio. Um estudo publicado por Rogério Meneghini, coordenador científico da biblioteca SciELO Brasil, mostrou que mesmo artigos escritos em inglês, mas publicados em revistas brasileiras, produzem em média menos citações. Meneghini convidou nove cientistas brasileiros habituados a divulgar seus trabalhos em revistas internacionais a publicar um artigo original na edição de maio de 2008 dos Anais da Academia Brasileira de Ciências. A intenção era avaliar até que ponto esses autores seriam capazes de transferir seu prestígio para a revista brasileira, que é publicada em inglês. Dois anos após a publicação, observou- -se que o número de citações desses artigos superou o dos demais artigos da revista: foi 1,67 citação ante 0,76 dos outros. Já os 62 artigos publicados pelos mesmos autores em revistas internacionais em 2008 tiveram, em média, 4,13 citações cada um. Segundo Meneghini, a diferença pode ser atribuída ao fato de as revistas brasileiras terem menos visibilidade internacional, embora também haja uma tendência de os autores enviarem seus melhores artigos para o exterior. Mas um dado marcante foi a constatação de que os nove autores abstiveram-se de citar artigos de revistas brasileiras. Apenas 1,52% das citações feitas por eles em 2008 se referiam a trabalhos publicados nacionalmente. Meneghini sugere que citar revistas nacionais não dá prestígio. "Parece que os autores optaram por negligenciar citações em periódicos brasileiros assumindo que eles podem passar a impressão de que o artigo é falho", disse.
Tal contingência não ofusca o consenso de que é fundamental estimular a produção em inglês. "Quando um pesquisador se esforça para citar trabalhos de seu país, é frustrante ver que a referência não pode ser consultada no exterior porque o trabalho está disponível apenas em português", diz Sonia Vasconcelos. Para Abel Packer, da SciELO, a solução é investir na tradução de artigos escritos em português, tornando-os disponíveis também em inglês. "Isso exigiria investimentos pesados, mas não consigo ver outra saída para aumentar a visibilidade do conjunto da ciência brasileira", afirma Packer.
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** O presidente negro pintou-se de branco e alisou o cabelo

Correio da Cidadania – 15 de março de 2011

O presidente negro pintou-se de branco e alisou o cabelo

Escrito por Mário Maestri   
17-Mar-2011
  Não se assustem os leitores. Não se trata de Barack Obama, o 44° presidente yankee, que visitará em breve o Brasil, sob o frisson geral nascido de suas promessas eleitorais reformistas, que, no seu país, já terminou há muito no ralo da decepção. Refiro-me ao infeliz Jim Roy, o 88º presidente estadunidense, eleito no distante ano de 2.228, que se suicidou antes da posse como primeiro mandatário afro-estadunidense. E razões não lhe faltavam para o ato desesperado.
  Após embranquecer a pele até parecer uma "barata descascada", ao igual que todos os afro-estadunidenses, Jim Roy amaciou e alisou os cabelos, seguido também por seus eleitores, logo após sua vitória, obtida com manobra eleitoral oportunista. Para tal, serviu-se de milagroso produto oferecido pela indústria branca, que disfarçava potente esterilizador masculino.
  Esterilização que, organizada pelos "supremos chefes da raça branca", resolveu o "choque das raças" preservando a "pureza ariana" nos USA, ao pôr um "manso ponto final" à raça negra. Ato consagrado como mais uma "vitória da eugenia" – eugenia, para os que não sabem, é a ciência da melhoria da raça humana pela seleção dos reprodutores, mais ou menos como se faz "na criação de belos cavalos puros-sangues".
  Com o título de O choque, o romance do choque das raças na América no ano de 2228, Monteiro Lobato lançou pela então prestigiosa Companhia Editora Nacional, em 1926, texto já apresentado, em vinte capítulos, como folhetim, no jornal A Manhã, do Rio de Janeiro, em setembro e outubro daquele ano. Na edição argentina, de 1935, o livro teve o título El presidente negro: novela americana del año 2228, assumido nas demais re-edições O presidente negro: o choque das raças.
  Recuperando o irrecuperável
  Em 2008, a Globo reapresentou – em forma oportunista – o romance com o título politicamente correto de O presidente negro, sem referência ao "choque das raças". Na apresentação do romance, "Um fabulista visionário", os autores se retorcem como minhoca na ponta do anzol para livrar o texto das suspeitas de racismo "dos críticos de plantão". Mesmo concedendo "reverberarem" nele as "controvertidas teses de purificação étnica difundidas entre a intelectualidade brasileira", apontam-no como "ficção científica futurista" que mostraria o "conflito (racial)" "sob a perspectiva do próprio negro", combatendo a "imitação dos hábitos e costumes", ou seja, a aculturação negra!
  O presidente negro: o choque das raças foi o único romance de Monteiro Lobato. Talvez sua fragilidade literária ajude a compreender por que o prolífico autor jamais retornou ao gênero, consagrando-se literária e economicamente com a literatura infanto-juvenil, que literalmente fundou no Brasil. O romance destaca-se, sobretudo, na produção cultural brasileira como paradigma da literatura e da propaganda racista e eugênica.
  E que não fiquem dúvidas. No romance, o narrador e os protagonistas positivos alardeiam as melhorias sociais possíveis de serem obtidas com a literal eliminação dos seres tidos como geneticamente inferiores. "A Lei Owen, como era chamado esse Código da Raça, promoveu a esterilização dos tarados, dos malformados mentais, de todos os indivíduos em suma capazes de prejudicar com má progênie o futuro da espécie".
  "Desapareceram os peludos, os surdos-mudos, os aleijados, os loucos, os morféticos, os histéricos, os criminosos natos, os fanáticos, (...), os místicos, os vigaristas, os corruptores de donzelas, as prostitutas, a legião inteira de malformados no físico e no moral, causadores de todas as perturbações da sociedade humana".
  Servindo-se da voz de sua heroína, Monteiro Lobato recrimina, igualmente, a "solução" brasileira para a "questão racial" − a miscigenação: "A nossa solução foi medíocre. Estragou as duas raças, fundindo-as. O negro perdeu as suas admiráveis qualidades físicas de selvagem e o branco sofreu a inevitável piora de caráter, conseqüente a todos os cruzamentos entre raças díspares".
  O Sul é o meu país!
  Mas não devemos nos desesperar sobre o futuro do Brasil, que Monteiro Lobato também aborda. Ele foi dividido em dois, nesse distante futuro. Os mestiços de portugueses, negros, índios e asiáticos ficaram reduzidos ao marasmo, na parte norte "tropical", enquanto o arianismo dos imigrantes dava origem, na parte sul, ao longo do rio Paraná, a uma vigorosa e saudável civilização ariana, no melhor estilo do "O Sul é o meu País". Metade sul acrescida, porém, da Argentina, Uruguai e Paraguai − o que foi feito da população guarani do último país, certamente inferior, o autor não revela!
  O romance de Monteiro Lobato não pode ser qualificado de nazista e genocidário apenas por ter precedido o sucesso daquele movimento, vitorioso na Alemanha apenas em 1933, e o extermínio de judeus, ciganos, doentes mentais, mal-formados etc., durante a 2ª Guerra Mundial. Massacre multitudinário seletivo em nome da pureza e da seleção racial que cunharia o sentido moderno do termo genocídio. Um dos interesses dessa ficção macabra de Monteiro Lobato é precisamente o registro, no Brasil, da larga propaganda racista e eugenista mundial, que precedeu a vitória do nacional-socialismo na Alemanha, expressão particular, e não construtora, dessa visão racista e classista de mundo.
  Além de racista, Monteiro Lobato era também sexista. Para o gentil criador da Emília, do Sítio do Pica-pau Amarelo, não é que a mulher seja inferior, ela é apenas constitutivamente diferente, o que lhe determina sua inferioridade nata! "Menos de uma pretensa inferioridade de cérebro de que uma organização cerebral diversa da do homem e, portanto, inapta a produzir o mesmo rendimento quando submetida ao mesmo regime de educação".
  A definição da "feminista" não deixa dúvidas sobre a visão do autor sobre a necessária submissão voluntária da mulher ao homem que, diga-se de passagem, conclui a revolta e a organização feminina branca independente, que permitiram a chegada ao poder do presidente preto. "(...) a feminista, a odiosa mulher-homem", que pensa "com idéias de homens", usa "colarinho de homens", conseguindo apenas "não ser homem nem mulher".
  O presidente negro: o choque das raças apresenta-nos, com singular falta de pudor, a visão racista e eugênica de mundo compartida, em maior ou menor grau, por grandes parcelas da intelectualidade e das chamadas classes dominantes no Brasil, nas primeiras décadas da República.
  Teorias da hierarquização racial que, apenas mediadas com maior contenção, foram a base de interpretações referenciais na cultura brasileira, como Os sertões: campanha de Canudos (1902), e Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal (1933), de Gilberto Freyre. No Rio Grande do Sul, um dos expoentes dessas visões raciais foi o historiador Moysés Vellinho, patrono do Arquivo Histórico de Porto Alegre.





  Mário Maestri é professor do Curso e do Programa de Pós-Graduação em História da UPF-RS.
E-mail: maestri@via-rs.net Este endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o Javascript terá de estar activado para poder visualizar o endereço de email
 

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** Dez Anos Sem Milton Santos - artigo de Silvio Tendler

 


 


Dez Anos Sem Milton Santos





Ou Biutful e Inside Job, duas faces da mesma moeda.

Silvio Tendler

No inicio de 2001 entrevistei o professor Milton Santos. A riqueza do depoimento do geógrafo me obrigou a transformá-lo no filme "Encontro com Milton Santos ou o mundo global visto do lado de cá" . Lá pelas tantas o professor critica a "neutralidade" dos analistas econômicos dizendo que eles defendiam os interesses das empresas que serviam.

Dez anos depois o cineasta Charles Ferguson em seu magnifíco filme "Inside Job" esmiuça em detalhes a fala de Milton Santos e revela a promiscuidade nos Estados Unidos entre bancos, govêrno e universidades. Revela a ciranda entre universitários que servem a bancos e empresas financeiras, vão para o govêrno, enriquecem nesse trajeto, não pagam impostos, escrevem pareceres milionários para governos estrangeiros induzindo  a adotarem políticas que favoreçam o sistema financeiro internacional. Quebram aplicadores e fundos de pensão incentivando a investirem em papéis, que já sabiam, com antecedência, micados. E quando são demitidos das instituições financeiras partem com indenizações milionárias.  Acertadamente este filme ganhou o Oscar de melhor documentário de 2011

Na outra ponta da história está o filme "Biutiful" do Mexicano Alezandro Gonzalez Iñarritu, rodado em Barcelona. e narra a vida dos fodidos, das vitimas do sistema financeiro internacional: Africanos e chineses que vão para a Espanha para escapar da fome e do desemprego e se submetem a condições de vida sub-humanas. O trabalho do ator Javier Bardem rendeu o prêmio de melhor ator do Festival de Cannes de 2010.

São filmes para ninguém botar defeito e descontroem as perversidades do mundo em que estamos vivendo.

Em discurso recente em Wisconsin, solidário aos trabalhadores que lutam contra novas gatunagens, o colega norte-americano Michael Moore declarou:

"Vou repetir. 400 norte-americanos obscenamente ricos, a maior parte dos quais foram beneficiados no 'resgate' de 2008, pago aos bancos, com muitos trilhões de dólares dos contribuintes, têm hoje a mesma quantidade de dinheiro, ações e propriedades que tudo que 155 milhões de norte-americanos conseguiram juntar ao longo da vida, tudo somado. Se dissermos que fomos vítimas de um golpe de estado financeiro, não estamos apenas certos, mas, além disso, também sabemos, no fundo do coração, que estamos certos.Mas não é fácil dizer isso, e sei por quê. Para nós, admitir que deixamos um pequeno grupo roubar praticamente toda a riqueza que faz andar nossa economia, é o mesmo que admitir que aceitamos, humilhados, a ideia de que, de fato, entregamos sem luta a nossa preciosa democracia à elite endinheirada. Wall Street, os bancos, os 500 da revistaFortune governam hoje essa República – e, até o mês passado, todos nós, o resto, os milhões de norte-americanos, nos sentíamos impotentes, sem saber o que fazer".

E arrematou com maestria e indignação:
"...Falei com o meu coração, sobre os milhões de nossos compatriotas americanos que tiveram suas casas e empregos roubados por uma classe criminosa de milionários e bilionários. Foi na manhã seguinte ao Oscar, na qual o vencedor de melhor documentário por "Inside Job" estava ao microfone e declarou: "Devo começar por salientar que, três anos depois de nossa terrível crise financeira causada por fraude financeira, nem mesmo um único executivo financeiro foi para a cadeia. E isso é errado. "E ele foi aplaudido por dizer isso. (Quando eles pararam de vaiar discursos de Oscar? Droga!)"


Esse ano celebramos os dez anos da morte do professor Milton Santos. Quem quiser ler "Por uma Outra Globalização"i  do Professor Milton Santos encontrará um diagnóstico perfeito do processo de globalização que gestou as mazelas descritas em "Inside Job" e "Biutiful". Quem qiser reencontrá-lo em  "Encontro Com Milton Santos ou O Mundo Global Visto do Lado de Cá",  estará celebrando a vida e o pensamento de  um dos maiores pensadores do Século XX, capaz de ter antecipado muito do que estamos vivendo hoje. Sempre com seu sorriso nos lábios e o olhar que revelavam sua clarividência desde o primeiro momento em que começava a se manifestar.


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