Grande imprensa apoiou golpe militar e a ditadura até 1968
Jornais analisados não viam
legitimidade nas reivindicações
de movimentos de rua
A grande imprensa, em geral, valoriza a sua posição de crítica e resistência no período da ditadura militar no Brasil. Colocam-se como porta-vozes da democracia e defensores dos interesses populares nesse momento histórico. Entretanto, uma pesquisa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP verificou que o papel dos dois maiores jornais no início do regime militar foi complexo, com apoio ao golpe, à ditadura e de condenação do trabalhismo e de movimentos sociais.
O estudo do professor de história Eduardo Zayat Chammas analisou editoriais dos veículos Correio da Manhã e Jornal do Brasil entre 1964, ano do golpe, e 1968, ano de implantação do Ato Institucional 5 (AI-5). Os dois jornais, nesse tipo de texto que expõe a opinião do veículo, mostraram-se a favor da queda de João Goulart do poder. O primeiro, inclusive, publicou editoriais na capa pedindo a saída do presidente e se declarou "herdeiro dos ideais democráticos da revolução de 1964", segundo Chammas.
Durante a ditadura, os dois jornais trouxeram algumas ressalvas em alguns momentos pontuais. Por exemplo, depois da passeata dos 100 mil em protesto contra os militares, em junho de 1968, o Jornal do Brasil questiona alguns pontos do regime. O Correio da Manhã questionou, nos primeiros quatro anos, as medidas que apresentassem alguma restrição à liberdade de imprensa.
O professor aponta que os dois jornais tinham um alvo de críticas em comum: os trabalhistas. "Eram contra o projeto social desenvolvimentista que possibilitava mudança nas estruturas sociais, na estrutura de poder", explica. "Só era legítimo o poder que vinha das instituições formais da democracia liberal, como o poder legislativo ou a própria imprensa, considerada a porta-voz da opinião pública. Os movimentos das ruas não tinham voz para esses jornais". Um exemplo disso é que ambos foram a favor do Estatuto da Terra, que nega uma reforma agrária voltada ao povo e traz grandes empresas capitalistas para o campo.
O movimento estudantil, apesar de criticar os militares, foi bem noticiado até 1968 pelo Correio da Manhã, pois, segundo o pesquisador, "este jornal dialogava um pouco mais com as classes médias, de onde vinham esses estudantes". Entretanto, naquele ano, as tensões políticas eram maiores, e as ações dos militares mais cerceadoras ao movimento. Os estudantes estavam tomando posições mais radicais e apresentando um discurso mais parecido com o da esquerda clássica. Sendo assim, o veículo retirou o apoio ao movimento.
Editoriais do Correio da Manhã no dia do golpe e no seguinte
traziam, respectivamente, as manchetes Basta! e Fora!,
referindo-se a João Goulart
Atos institucionais
No estudo, intitulado A ditadura militar e a grande imprensa: os editoriais do Jornal do Brasil e do Correio da Manhã entre 1964 e 1968, a postura dos jornais sobre os atos institucionais, (AI) que eram uma série de decretos que o governo militar anunciava, com novas normas a serem cumpridas, teve importância. Até o quarto AI, o Jornal do Brasil não contestou nenhum deles. O Correio da Manhã, por sua vez, fez críticas leves às medidas, nesses atos, que iam contra as liberdades individuais, principalmente de expressão.
Com o AI-5, que diminuiu muito as liberdades dos cidadãos, implantou a censura a toda forma de manifestação contra o governo e aumentou muito mais o controle do estado sobre a imprensa, a postura dos jornais mudou. "Os dois veículos dialogavam com a classes média e a burguesia, que foram mais afetadas depois do AI-5", esclarece Chammas.
Veículos
A escolha do Jornal do Brasil e do Correio da Manhã aconteceu por diversos motivos. O estudo, que foi orientado pelo professor Marcos Francisco Napolitano de Eugênio, optou por jornais com a sede no Rio de Janeiro, já que "a cidade havia deixado de ser capital havia poucos anos e ainda era palco da cena política no país", segundo Chammas.
A escolha do Jornal do Brasil e do Correio da Manhã aconteceu por diversos motivos. O estudo, que foi orientado pelo professor Marcos Francisco Napolitano de Eugênio, optou por jornais com a sede no Rio de Janeiro, já que "a cidade havia deixado de ser capital havia poucos anos e ainda era palco da cena política no país", segundo Chammas.
Além disso, diferentemente de jornais mais populares, os escolhidos dialogavam com o público que tinha mais influência na política do País, classes mais altas. Eles também não eram vinculados a um partido específico. Outros fatores determinantes são que eram os dois jornais com maior tiragem no país e tinham circulação nacional.
Imagens: Wikimedia / Cedidas pelo pesquisador
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